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A Ruiva, o Picareta e o Depressivo

  • Foto do escritor: Giovana Cogo
    Giovana Cogo
  • 9 de mai. de 2018
  • 5 min de leitura

A vida boêmia de Ruy sustentada por golpes e picaretagens acabara de por uma corda em seu pescoço. Olhou para os lados e se viu cercados pelo pior tipo de gente, os que ganham dinheiro para por quem deve ao seu patrão no lugar, e Ruy devia, muito, ao patrão daqueles caras.

Ruy levou socos no estômago até ser derrubado e depois chutes pelo corpo todo. Os caras batiam como crianças mas ainda assim causavam estrago, inclusive um nariz quebrado. Apanhou tanto naquela tarde que perdeu o foco do céu e da cidade, chagou a se esquecer que estava em um beco. Apenas martelava em sua cabeça que da próxima vez, não seria um aviso para pagar o chefe deles, seria um tiro na cabeça, acabando com seu rostinho lindo (nem tão lindo mais, por causa do nariz torto).

O sol estava tão quente que se obrigou, cheio de dor nos músculos e não conseguindo respirar, a se arrastar pra sombra mais próxima. Se alguém entrasse ali, naquele beco, pensaria que estava morto. mas estava apenas tentando recuperar os sentidos e conseguir levantar pra ir num encontro antes do anoitecer.

Ele tinha um golpe, digo encontro, marcado para aquela tardezinha num bar bem frequentado. Duas moças completamente doentes por gostarem de sair com caras como Ruy, o esperavam numa mesa mais afastada, para tomar um vinho e bebidas do tipo. Elas gostavam de marginais gananciosos e bonitos, da sensação de perigo na boca do estômago que estar com o rapaz causava. Elas bebiam tanto e falavam tanto, que Ruy quase foi embora sem tentar nada, por pena das pobres filhinhas de papai.

Ruy esticou o braço discretamente, e quando elas menos notaram a chave do carro delas estava com ele.

_Com licença, meninas. -pediu e dizendo ir pro banheiro, apenas saiu pela porta dos fundos que dava pro estacionamento. Tentou destrancar todos os carros e no último as luzes piscaram.

_Por que sempre tem que ser o último? -se perguntou.

Deu partida, colocou a primeira marcha e dirigiu pelas ruas, sem destino. Apenas aproveitando seu último golpe.

Freou para deixar uma ruiva passar. Com um corpo e rosto muito bonito, ela atravessou a rua devagar e completamente atordoada, parecia desligada desse mundo.

_Ei! -chamou ela, que se virou com o semblante assustado, estava com as mãos cobertas de sangue. -O que aconteceu? Quer ajuda? -ele perguntou. Ela apanas entrou no carro.

_Como é seu nome? -perguntou meio acanhado, pois parecia que um furacão tinha passado pela moça.

_Ruína.

O vigarista olhou pros cabelos desgranhados e o olhos vidrados dela e pensou que aquele nome combinava com ela no momento. Tomara que não tenha sigo a vida toda assim, ele pensou. E não foi.

A ruiva era uma moça normal, com sonhos normais. Tinha um salão de beleza unissex e atendia todos os dias poucos, mas clientes fiéis. O dia foi comum até quarenta minutos antes de conhecer o motorista do carro. Ela tendeu os clientes antigos e um novo, um senhor de meia idade que foi fazer a barba em seu salão. Durante o "corte" o senhor passou a mão por baixo da saia dela, que congelou. E quando veio pra cima dela, colocando-a contra a parede, na tentativa de se soltar ela conseguiu cortar a mão dele com a navalha e chutou seu joelho, ele bateu a cabeça na quina de um móvel e caiu no chão, sangrando mais na cabeça que na mão. Ruína não sabia como aquilo tinha acontecido tão rápido, tentou enxugar o sangue mas acabou mais suja. Desesperada e sem ideias, foi pra fora, seria uma questão de tempo até ser presa. Enlouqueceria por ter matado um homem, um homem nojento e porco.

E ali estava, no banco de carona de um cara de cabelos castanhos e nariz torto, um estranho.

_Tá me ouvindo? -Ruy tirou ela do transe de reviver suas memórias macabras.

_Quê? -ela piscou algumas vezes.

_Eu estou dizendo que não importa o que você tenha feito, estamos no mesmo barco. -ele falava e olhava a avenida ao mesmo tempo.

_Por quê? -ela não entendia.

_Esse carro é roubado. -ele olhou pra ela.

_Eu já vou pra cadeia mesmo. -ela deu de ombros.

_Aqui. -estendeu uma toalha branca que estava em cima do painel do carro, Pra ela se limpar.

Ruína pegou a toalha e olhou pra frente. Soltou um grito apontando pra alguém, lá na frente. Ruy instintivamente pisou no freio e fez o baque ser mais leve.

A alguns metros, um cara loiro estava caído no chão.

_Eu matei ele? -perguntou para a ruiva.

_Acho que não. -limpou as mãos -Ele viu o carro, por que não saiu da frente? -perguntou.

_Que desgraçado! -Ruy desceu do carro, vermelho de cólera.

Lá fora o loiro tentava se levantar.

_Ô, Zé ruela! Não olha por onde anda não? -pegou-o pelo colarinho da camisa e puxou, mas o loiro começara a rir como um desvairado. Ruy deu um soco nele, que ria ao apanhar, deixando um corte no nariz do Zé ruela.

_Ei! Pára! -Ruína começou a puxar Ruy pela jaqueta. -Deixa ele, não quero participar de mais um homicídio hoje.

_Não, me mata. Eu tentei três vezes, só hoje e não consegui. -saía um pouco de sangue da boca dele. - quem sabe vocês não tenham mais sorte que eu.

_Realmente não vale a pena. Ele é mais miserável que nós dois juntos. -disse Ruy, soltando o pobre suicida.

A verdade é que Ruína simpatizou com os olhos fundos do loiro, eles eram tão insanos quanto os dela.

_Vem com a gente. -ela chamou. -Como é seu nome?

_Me chama de Ed.

_Eu não quaro levar ele! -protestou Ruy.

_Onde cabem dois, cabem três. -ela piscou.

Os três voltaram pro carro, com o silêncio perdurando.

Depois de alguns quilômetros a gasolina começou a ficar na reserva tiveram que parar num posto de gasolina. Aproveitaram e dormiram lá. Também fizeram uma descoberta muito boa, havia milhares de dólares no porta-mala do carro. Ruy tinha uma sorte para encontrar dinheiro que o fez ser o salafrário que era.

Ao acordar, no dia seguinte, ele propôs aos outros dois um dia de sofisticação. Afinal, uma coisa que a vida lhe ensinou, foi a se divertir. Voltaram pro carro e foram gastar tudo no cassino da cidade. Eles jogavam dinheiro fora, na festa que durava para sempre e fazia todo dia parecer sábado.

Era completamente louco, tão louco quanto aqueles três. O único problema é que Ruy ficava sobrando e isso fazia ele se sentir excluído. Ele sempre ficava entre o dois pra impedir que se beijassem de novo. Como durante a noite que ele passou, no quarto do hotel, ouvindo os beijos baixinhos. Calafrios percorrendo sua espinha. A sorte no dinheiro sugara a do amor.

Ao cair da noite foram com o carro branco até uma lanchonete e depois iriam se divertir em um hotel de luxo, se não fosse pela sirene da polícia em seus encalços.

_Eu não vou pra cadeia! -Ruy bradou.

_Nem eu! -Ruína sorriu pra ele.

_Eu não vou pra um manicômio.

A ruiva e o picareta se olharam e depois encararam o depressivo. Todos caíram na gargalhada.

_Então como vamos fugir? -Ruy pisava fundo no acelerador, mas uma hora seriam pegos.

_Para ali na ponte. -Disse Ed.

_O que você vai fazer? -perguntou Ruína.

_O que eu sempre quis.

_Eu também -a moça segurou na mão do loiro, com os olhos tristes. -não conseguiria mesmo viver com o peso na consciência.

_Estamos nessa juntos. Era meu último golpe mesmo, deve ser melhor que ter o crânio estourado. -Ruy deu de ombros, fazendo a curva e entrando na ponte.

Parou o carro no meio e desceram correndo.

Subiram no beiral, olharam uns pros outros e, com um sorriso, se jogaram.

Tiveram as últimas vinte e quatro horas que todos deveriam ter.

Esqueceram seus demônios e saltaram no abismo, em busca da paz no espírito.





*Comecei a fazer um conto pra escola e saiu isso aí.

**Se é um conto, eu não sei.

***Mas eu gostei bastante.

****Sacou a referência quem sacou.


 
 
 

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